terça-feira, 4 de maio de 2010

Abdominoplastia Após Grande Perda de Peso

A obesidade é uma doença com incidência e prevalência crescente, afetando todas as faixas etárias. As complicações da obesidade são bem conhecidas. Uma redução dramática do peso, seja através de dieta, medicação adequada, exercício ou cirurgia podem reverter à morbidade e a mortalidade associada à mesma.


Entre os efeitos indesejáveis de uma grande perda ponderal podemos incluir, além da diminuição excessiva do tecido celular subcutâneo, a redundância cutânea e a flacidez das fascias superficial e profunda. A região abdominal destes pacientes apresenta ainda com freqüência uma insuficiência da musculatura, decorrente da infiltração de gordura no tecido muscular, da hipotonia ou atrofia devido ao sedentarismo ou como conseqüência da diástase dos retos abdominais pós-gestações.


O aspecto “em avental” costuma ser a principal queixa destes pacientes e pode causar, além do aspecto inestético, limitações físicas, distúrbios psicológicos e queixas álgicas.


A abdominoplastia é um procedimento comum em ex-obesos e geralmente o primeiro e o mais freqüente a ser realizado. Seu objetivo é dar nova forma à parede abdominal através de uma dermolipectomia, reforço das estruturas músculoaponeuróticas com correção de eventuais hérnias, e onfaloplastias. Muitas são as técnicas cirúrgicas descritas na literatura especializada. Por isso, a variedade no dismorfismo apresentado por estes pacientes exige uma avaliação cuidadosa no pré operatório, com o objetivo de estabelecer a melhor estratégia para cada caso.



Anatomia



Os músculos oblíquo externo, oblíquo interno e transverso formam a parede lateral do abdome. Os músculos retos são pares e se estendem da quinta costela até o púbis. Estão separados na linha média pela linha Alba, que se inicia no processo xifóide do esterno e se estreita abaixo da cicatriz umbilical.


A linha semicircular de Douglas está situada a meia distância entre o umbigo e a sínfise púbica. Acima desta linha, a bainha posterior do reto é composta pela fascia do músculo oblíquo interno, músculo transverso abdominal e fascia transversalis; a bainha anterior é composta pela aponeurose do músculo obliquo externo e lamela anterior da aponeurose do músculo oblíquo interno.


Abaixo da linha semicircular, a bainha do reto posterior é composta por uma fina camada de fascia transversalis, pois as fascias dos músculos oblíquo interno, oblíquo externo e transverso passam anteriormente ao músculo reto.



Vascularização, Inervação e Drenagem Linfática



A região medial do abdome é vascularizada por ramos perfurantes das artérias epigástricas superiores e inferiores, que se anastomosam na bainha do músculo reto abdominal.


O hipogástrio é nutrido pelas artérias circunflexa superficial, epigástrica superficial e alguns ramos perfurantes do segmento proximal da artéria epigástrica inferior.


As paredes laterais do abdome são nutridas por ramos perfurantes das artérias diafragmática, intercostal e lombar.São responsáveis pela vascularização do retalho cutâneo lateral na abdominoplastia em âncora.


A inervação da parede abdominal ocorre através dos ramos primários anteriores dos nervos torácicos espinhais T7 – T12 e um nervo lombar L1.


O suprimento linfático acima do umbigo se dá para os gânglios linfáticos axilares ipsilateral, abaixo do umbigo, drenam para os gânglios linfáticos inguinais superficiais ipsilaterais. Os linfáticos superficiais correm paralelos às veias superficiais, que acima do umbigo drenam para a veia axilar e abaixo, para a veia femoral.



Rotina Pré Operatória



DEVE INCLUIR:




  • Anamnese minuciosa, incluído pesquisa de queixas respiratórias (asma, apnéia do sono) e número de gestações.

  • Evolução da perda ponderal, cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC) e tempo de estabilidade do peso.

  • Exame físico completo, com ênfase na parede abdominal, a fim de diagnosticar possíveis hérnias umbilicais ou incisionais e a presença e o grau de diástase dos músculos retos abdominais.

  • Avaliação da qualidade e do grau de flacidez da pele, adiposidade residual, posicionamento das cicatrizes, presença de lesões cutâneas geradas pelo atrito de áreas ptosadas.

  • Informação detalhada sobre a cirurgia, incluindo a entrega do informativo da SBCP sobre abdominoplastias.


RECOMENDAÇÕES AO PACIENTE




  • Suspender tabagismo (mínimo de 15 dias)

  • Suspender drogas anticoagulantes (AAS, heparina, ginseng, gincobiloba, chá de louro, etc.)

  • Utilizar sabonete anti-séptico três vezes ao dia nos três dias anteriores à cirurgia e no dia da mesma ao despertar.

  • Manter alguma atividade física.

  • Ler o informativo referente à cirurgia e esclarecer eventuais dúvidas com o cirurgião.


EXAMES COMPLEMENTARES



A rotina pré operatória inclui exames laboratoriais, eletrocardiograma, radiografia de tórax e risco cirúrgico.


A Ultrassonografia de abdome com ênfase na parede abdominal é mandatória para avaliar a presença de hérnias não identificadas no exame físico, além de outras patologias intra-abdominais que devem ser tratadas previamente ou em conjunto com a abdominoplastia.


Documentação fotográfica pré-operatória, autorização para publicação das mesmas e termo de consentimento informado são obtidos de todos os pacientes.



Técnicas Cirúrgicas



Nas abdominoplastias utiliza-se a anestesia geral ou a peridural. Com freqüência associam-se as duas técnicas para uma melhor analgesia pós operatória


O dismorfismo gerado pela perda ponderal possui grande diversidade de apresentações, gerando uma dificuldade de classificar adequadamente os pacientes e padronizar o tratamento.


Muitas técnicas cirúrgicas foram descritas. Neste capítulo apresentaremos as que abordam exclusivamente a região abdominal, são elas, a abdominoplastia suprapúbica, a inframamária, a em âncora e a dermolipectomia higiênica.



EM ÂNCORA



A abdominoplastia com cicatriz em âncora é a mais utilizada em pacientes após perda ponderal expressiva. Isto se deve a grande excedente dermoadiposo tanto no sentido horizontal quanto no vertical. A cicatriz mediana prévia quando existe em casos de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica, facilita a indicação da mesma. Esta técnica permite maior retirada do tecido excedente e proporcionar melhor contorno corporal, principalmente na cintura.


O planejamento pré-operatório é realizado com o paciente inicialmente na posição ortostática. A linha média é marcada do apêndice xifóide à sínfise púbica. Através de manobra bimanual marca-se o ponto A, B e C conforme figura 1. O ponto A é o ponto mais alto da linha média, sendo este o limite superior da ressecção. Os pontos B e C são obtidos através da tração obliqua em direção da sínfise púbica. A margem inferior da ressecção deve estar entre 7,0 a 9,0 cm da comissura vaginal ou base do pênis e se estender lateralmente até espinhas ilíacas ântero-superiores. Ligam-se os pontos A, B e C através de linhas côncavas. A marcação deve ser confirmada com o paciente em decúbito dorsal para torná-la a mais precisa possível.



A cirurgia tem início pela incisão circular da cicatriz umbilical e seu isolamento. Em seguida, após confirmação prévia da marcação pré-operatória, incisa-se até o plano aponeurótico. O excesso dermoadiposo previamente marcado é retirado em bloco, no sentido de cranial para caudal e de lateral para medial. Importante não descolar os retalhos remanescentes.


Esta técnica permite uma exposição direta dos retos abdominais, facilitando sua abordagem. Realiza-se a plicatura destes músculos levando em consideração a diástase presente.


A cicatriz umbilical deve ser fixada a aponeurose em posição anatômica.


Antes do avanço dos retalhos abdominais e do início das suturas, deve-se flexionar a mesa operatória em 30º, diminuindo a tensão das suturas.


Os pontos B e C são aproximados à linha média da incisão inferior (ponto D), conforme figura 2.


Em topografia da cicatriz umbilical é ressecado uma meia lua de tecido dermoadiposo com cerca de 1,0cm de raio, bilateralmente, seguida pela síntese.


A síntese é realizada por planos, sendo a drenagem aspirativa sempre utilizada.


O curativo é realizado com esparadrapo cirúrgico estéril e com atadura elástica.


ABDOMINOPLASTIA REVERSA



Consiste na ressecção do excesso dermoadiposo do abdome superior por meio de incisão submamária. Está indicada especialmente quando da existência de cicatrizes pré-existentes nesta região ou naqueles pacientes submetidos à abdominoplastia prévia que apresentam redundância de tecido na parede abdominal superior .


A avaliação é realizada com o paciente em posição ortostática e em decúbito dorsal As marcações são feitas nos sulcos submamários, unidas na linha média. O excesso é determinado por manobra bi-manual através de tração da pele no sentido cefálico .


A abordagem cirúrgica do abdome superior pode ser feita de quatro formas distintas, conforme figura 3:



· Descolamento até a cicatriz umbilical, sem liberação da mesma É a mais utilizada. O retalho dermoadiposo excedente pode ser utilizado na região mamária como cobertura ou como preenchimento.


· Descolamento ultrapassando a cicatriz umbilical, sendo esta liberada ou não. É indicado para casos de flacidez supra-umbilical, com pequena diástase.


· Incisão submamária associada com incisão transversa inferior como na abdominoplastia tradicional. Indicado quando há flacidez supra e infra-umbilical. É importante não comunicar as duas áreas de descolamento.


· Incisão submamária sem comunicação na linha média. A tração nestes casos deve ser em direção à axila.


A cirurgia começa com incisão submamária e o retalho abdominal é descolado caudalmente no plano aponeurótico. Realiza-se uma tração superior, sendo o excesso cutâneo excisado ou utilizado na região mamária como cobertura ou como preenchimento. A fascia de Scarpa do retalho da parede abdominal é suturada na fascia Peitoral ou no periósteo da costela para prevenir alterações de posição e qualidade da cicatriz. Segue-se drenagem aspirativa e síntese por planos. O curativo é realizado com fita adesiva cirúrgica e atadura elástica.



SUPRA PÚBICA



Indicada para pacientes sem excesso dermoadiposo lateral, principalmente na ausência de cicatriz mediana prévia, como nos casos de emagrecimento após cirurgias bariátricas videolaparoscópicas ou aqueles que emagreceram através de dieta e exercício. Muitas vezes é precedida por lipoaspiração.


A marcação pré-operatória é feita com o paciente em posição ortostática, sendo reavaliada no per operatório em decúbito dorsal. Primeiro, delimitamos a linha da incisão inferior, com concavidade no sentido cranial, situando-se abaixo da prega delimitada pelo avental cutâneo, estendendo-se lateralmente em direção a crista ilíaca, conforme figura 4. Em seguida é marcada uma linha mediana, do apêndice xifóide à sínfise púbica, que auxiliará no posicionamento adequado da cicatriz umbilical. Acima desta, descolamos o retalho em forma de túnel até o apêndice xifóide, evitando estendê-lo lateralmente. Procede-se em seguida a plicatura da aponeurose dos retos abdominais.


Após a plicatura, que é feita com pontos separados em “X”, fixa-se a cicatriz umbilical à aporeurose, corrigindo possíveis desvios de posicionamento. Neste momento, o dorso da paciente é elevado em cerca de 30º. O retalho dermoadiposo é tracionado em direção caudal e o excesso é ressecado com o cuidado de retirar apenas o desejado, evitando tensão na sutura. Fixa-se o retalho superior à incisão inferior em seu ponto médio.


Uma incisão em forma de triângulo invertido é realizada no retalho na topografia da cicatriz umbilical assim como um desengorduramento do mesmo, com o objetivo de exteriorizar e suturar o coto umbilical fixado na aponeurose ao retalho. Finaliza-se com a drenagem aspirativa e síntese por planos.


DERMOLIPECTOMIA HIGIÊNICA



Essa técnica é utilizada em pacientes com IMC elevado, porém com grande perda ponderal e dificuldades para mobilização, higiene e convívio social. Muito realizada em conjunto com outras cirurgias abdominais, principalmente hernioplastias.


Pode ser realizada com vários tipos de incisão. O mais importante é o descolamento mínimo suficiente para exteriorizar a cicatriz umbilical, podendo inclusive não haver este descolamento e realizar uma neoonfalocele em segundo tempo. A plicatura dos músculos reto abdominais não deve ser realizada.



CUIDADOS PER OPERATÓRIOS



· Antibioticoterapia venosa no início do procedimento.


· Sonda vesical de demora.


· Proflaxia de TVP com uso de compressão pneumática intermitente ou meia elástica.


· Drenagem aspirativa.



CUIDADOS PÓS OPERATÓRIOS




· Posição de Fowler nas primeiras 24 horas, com movimentação dos membros e manutenção de meia elástica.


· Deambulação precoce


· Drenagem aspirativa mantida até débito abaixo de 50 ml em 24 horas



COMPLICAÇÕES



As complicações pós-operatórias em pacientes com grande perda ponderal são as mesmas das tradicionais cirurgias de contorno corporal, porém com incidência significativamente maior. A taxa de complicações e de resultados desfavoráveis é diretamente proporcional ao IMC na data da cirurgia. Geralmente os pacientes suportam melhor eventuais intercorrências, devido ao grande benefício estético e funcional alcançado.


São muitas as complicações descritas, dentre elas: seromas, deiscências, hematomas, TVP, necroses, granulomas, infecções.


A presença de seroma é freqüente devido à grande área excisada e a espessura do retalho remanescente. Para minimizá-lo, grandes descolamentos devem ser evitados e quando realizado recomenda-se lançar mão de pontos de adesão descritos por Baroudi. O uso de dreno aspirativo tem a função de não reter o seroma. Após sua retirada o paciente deve ser submetido a punções aspirativas e uso contínuo da cinta de média compressão. Com a experiência adquirida, há uma tendência a permanência do dreno por 7 a 10 dias, devido ao derrame linfático que se forma após a sua retirada precoce.


A área com maior índice de necrose e deiscência é a região suprapúbica e está relacionada à tensão nela depositada.


Pode-se encontrar com certa freqüência a presença de cicatrizes alargadas, hipertróficas, assimétricas, perda do contorno corporal, falha na retração da pele e retorno da flacidez, que são atribuídas à má qualidade do sistema fascial superficial, responsável por envolver, sustentar e dar forma aos tecidos.













Nenhum comentário:

Postar um comentário

Caso tenha interesse, a doutora Carina estará on-line, as segundas-feiras de 20:00 às 21:00 horas.